segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O Astronauta Onírico



O Astronauta Onírico
Ato II – Relicário Boreal
“Ainda sob o embarque de Apus, Cetus em velocidades incalculáveis afasta-se cada vez mais do Austral, enquanto tange com voluptuosidade os devaneios que o aguardam em Boreal...”

Depois de demasiada euforia, deu-se por conta Cetus de que algo lhe faltava,
De nada valeria chegar à sublime visão de Virgo, tendo as mãos vazias.
Era preciso ser garboso, ofertar-lhe relicário que em Austral não se encontrava...

Ouviu da boca de Auriga, menção sobre Lyra, sobre suas adoráveis melodias,
Deixou fixar-se na idéia de que sob encantos de Lyra, até doce Virgo cederia...
Afinal, se Orpheu dobrou Eurídice, dobraria Virgem sob Cetus ao longo dos dias.

Tal relicário escondia-se em emaranhados Coma de Berenices, como a lenda dizia,
Seu cabelo é na verdade o que vocês aí em baixo chamam de Linha do Equador,
E nem imaginais o quão tentado ficou Cetus, diante do que Berenices fazia...

Tranças e cachos, por onde ninfas subiam em direção aos céus, com ardor...
- Vós que cobiçais Virgo! Disse Berenices: deitais comigo e levas suposto relicário!
Ainda que devorasse seu corpo, Elíseos eram os jardins onde repousava seu amor.

- Pois se é no não que se descobre a faceta da verdade, não me venhas de solidário,
 E tocada pelo encanto de Cetus à Virgo, Berenices repousou na dor de sua solidão...
- Levais Lyra, pois amais Virgo, mas não a conquistará sem dar mão ao imaginário.

Ouviu que o real relicário boreal, se dá na aurora da imaginação,
Ganhou também majestosa trança, para que usasse de corda quando preciso...
E partiu, deixando pra trás a ínfima tira que dá origem a criação.

De longe via que o encontro entre a noite e o dia o deixava indeciso,
É o que causa no peito da gente a vista de uma aurora boreal...
Quando não se sabe dia, quando não se sabe noite, quando não se é preciso.

Mas conforta Cetus, saber que o amigo leitor ainda ache tudo muito surreal,
Que vossa eminência leitoral, ainda não tenha corrido à janela averiguar,
Pois ainda brilha no céu a nebulosa avermelhada, manchada pelo madrigal...


Antônio Piaia

2 comentários:

  1. Poesia bem bolada, muita criatividade, imaginação, cosmologia, misticismo e miticismo... Uma viajem interestelar, meu amigo. Uma legítima viajem por entre nebulosas e paixões... Abração e segue nessa Odisséia..

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  2. bah, muito legal cara... sonoridade muito boa, bem bolada mesmo... jogo de palavras e conceitos, muito bom.. ainda mais quando se realça o onírico detrás dessa camada de símbolo.

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